Estamos em setembro. Talvez por coincidência, seja o mês de início da primavera, o mês do setembro amarelo, e o mês de aniversário de uma cirurgia que salvou a minha vida. Setembro é um mês de renascimentos. Um mês que podemos plantar um bocado de sementes, o frio vai dando tchau, os dias ficam mais longos e tudo começa a brotar. Tanto na horta quanto na vida. Pelo menos na minha foi assim.
Foi no 13 de setembro de 2010 que eu entrei numa sala cirúrgica com 118 kg disposta a renascer. Me submeti a uma cirurgia bariátrica, aquela que reduz o estômago, não por questão de estética, mas porque uma equipe multidisciplinar constatou que sim: Eu precisava ser operada.
A cada quilo perdido eu percebia uma nova pessoa nascendo. Uma agrônoma recém formada, que buscava colocação no mercado de trabalho. Ser mulher no mundo agrícola não é uma tarefa muito fácil. Ser uma mulher GORDINHA, no mundo agrícola, parecia ser mais difícil ainda.
No primeiro mês, se foram 20 kg, no segundo, mais 16... E assim foram passando os meses, até que seis meses depois da cirurgia, eu nem me reconhecia mais no espelho. A Vivi tinha perdido 67 kg, e a vida tinha achado uma nova Vivi.
A paisagem começou a ter cores de novo. E foi aí que meu mundo se coloriu por completo. Comecei a trabalhar numa horta comercial. Onde eu era responsável pelo planejamento semanal do plantio de hortaliças. Nesses seis meses, eu ainda estava me adaptando ao meu planejamento alimentar. Eu não tinha paladar, eu não conhecia o gosto dos vegetais, pois eu não consumia aquilo que eu planejava na horta.
Até que eu ganhei uma cesta dos agricultores com diferentes tipos de vegetais. Até então, eu não tinha o costume de cozinhar. As minhas refeições sempre foram comida congelada e tudo que o mundo nos oferece de forma fácil. Eu abria muito mais pacotes do que descascava frutas.
Aquela cesta foi meu "DAY ONE".
Ou eu ia para a cozinha, ou a cesta toda estragaria. E do que adianta planejar todo plantio se depois da colheita eu deixo os vegetais estragarem? Foi a minha virada de chave. Fazer a cirurgia não foi a minha salvação, foi apenas uma ferramenta, para entender a importância do meu trabalho, ou a falta de importância que eu dava pra ele. Comprei livros de culinária, assistia todos os programas nacionais e internacionais de cozinha. Cada viagem que eu fazia eu queria aprender tudo sobre a culinária local.
Eu aprendi respeitar o ciclo da natureza, o tempo de cada semente, a evolução de cada fruta e de cada vegetal, além de aprender que eu precisava deles na minha alimentação, como aliados da nutrição, caso contrário, meu cabelo caía, eu seria fraca e cansada, e a anemia seria minha eterna melhor amiga. E com isso, eu construí pilares. Tês pilares que fizeram do meu aprendizado uma metodologia. Uma propriedade intelectual. A horta salvou minha saúde e PLANTAR COLHER e COZINHAR se tornaram meus "Frameworks". Minha marca registrada, que eu trouxe para o Instituto Quintal Urbano desde que aqui cheguei. E vai continuar comigo para onde eu for.
São as flores e frutos que nasceram no meu quintal.
Aprendi a ter respeito por cada vegetal.
Assim como eu, a horta salvou a vida de muita gente. Tanto financeira, quanto mentalmente. A horta tem ressurgido em vários quintais pelo mundo, e a importância da terapia que vem junto com ela, têm salvado muita gente da depressão. São crianças autistas, que entraram em contato com a terra. São crianças consideradas "chatas" pra comer que experimentaram uma panqueca verde e que largaram um sorrisinho. São adultos solitários que através do cultivo encontraram companhia, e assim os dias foram passando com uma carinha mais completa. São escolas que agregaram a metodologia na sua grade curricular, e com isso mudamos os hábitos alimentares do colaboradores, alunos e até dos familiares. São pacientes, sejam bariátricos, psiquiátricos, pediátricos, com necessidades especiais. A horta têm salvado toda essa turma. Da mesma forma que me salvou.
Essas duas pessoas são a Vivi. A Engenheira Agrônoma do Quintal Urbano e a professora do PLANTAR... COLHER e COZINHAR. Uma antes da horta e outra depois da horta. Se eu não tivesse feito a cirurgia, talvez eu nem trabalhasse com hortas hoje. Talvez eu ainda estivesse em depressão. Realmente não sei o que teria sido. Só sei, que tenho muito orgulho da pessoa que me transformei, da profissional que hoje eu sou, e de tudo isso ter começado num mês de setembro. Esse mês farei 10 anos de vida nova. São 10 novas primaveras. São 10 setembros que pra mim sempre serão amarelos como a cor da minha casa, como a cor das flores dos tomates, das abóboras, das calênculas e da Tagetes a flor mais bonita do meu quintal.
Drª Vivi Pretz
Engenheira Agrônoma
Drª em Sanidade Vegetal
Especialista em Hortas Orgânicas
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